8 de abr. de 2010

No Reino Unido, laboratório estuda futuro da mídia impressa


Eric Pfanner
Apenas alguns dias depois que a News Corp. anunciou planos de começar a cobrar pelo acesso online dos leitores dos jornais Times e Sunday Times, a chamada muralha do acesso pago também subiu no Southern Reporter, um jornal de Selkirk, Escócia.
Times, com sua história prestigiosa e circulação média de 505 mil exemplares, e o Southern Reporter, um jornal semanal com vendas da ordem de 15 mil exemplares, ocupam posições muito diferentes no mercado britânico de jornais. Mas suas decisões demonstram como o Reino Unido está se tornando um laboratório para o futuro dos jornais na era digital.
A questão para as empresas editoras é a seguinte: será que elas conseguirão persuadir número suficiente de leitores a pagar pelo acesso online a fim de compensar a perda de receita com circulação e publicidade das versões em papel, ou fariam melhor em manter o acesso gratuito aos sites e esperar que surja receita publicitária suficiente?
"Existe uma sensação real de que serviremos como laboratório de testes", disse Vanessa Clifford, que comanda a divisão de publicidade em mídia impressa da agência de compra de mídia Mindshare, em Londres.
"O Reino Unido ainda ama os jornais, a despeito de todos os rumores sobre seu declínio. Se não formos capazes de convencer número suficiente de pessoas a pagar por eles aqui, talvez seja impossível fazê-lo em qualquer outro lugar"
Diversos indicadores mostram que o Reino Unido continua a ser um mercado vibrante para os jornais. Há dez jornais de circulação nacional que, somados, vendem 10 milhões de cópias ao dia. Em um país com 60 milhões de habitantes, isso representa muitos jornais - muito mais do que em mercados europeus de dimensões semelhantes, a exemplo da França ou Itália. E os furos noticiosos dos jornais ainda têm o poder de movimentar os mercados financeiros, incomodar os políticos e irritar os motoristas de táxi.
Mas as quedas de circulação vêm se aprofundando. Tanto o Times quanto outro diário, o Guardian, tinham em fevereiro de 2010 circulação mais de 16% inferior à do mesmo mês no ano passado. A publicidade, em papel e na web, está custando a se recuperar da recessão. Sob pressão para estancar os prejuízos, as editoras de jornais britânicas estão se vendo como tema de notícias com frequência cada vez maior.
No mês passado, uma delas, a Independent News & Media, na prática pagou o investidor russo Aleksandr Lebedev para que assumisse o controle do jornalIndependent. Dias antes, a presidente-executiva do Guardian Media Group, Carolyn McCall, se demitiu para assumir o comando da easyJet.
A News Corp. logo depois anunciou que começaria em junho a cobrar pelo acesso online dos leitores aos sites do Times e Sunday Times. Embora oFinancial Times e o Wall Street Journal há muito cobrem pelo acesso aos seus sites, a decisão leva o Times a se tornar um dos primeiros grandes jornais a cobrar pelo acesso, antes de rivais como o New York Times e de sua edição mundial, o International Herald Tribune. E prepara o terreno para uma disputa entre posições completamente diferentes quanto ao futuro dos jornais no Reino Unido.
Os proponentes de uma mudança, como James Harding, editor do Times, dizem que o custo de produção de jornalismo de qualidade requer leitores pagantes.
"Dizer que nosso jornalismo tem valor zero e oferecê-lo de graça online não é um modelo econômico viável", ele declarou em palestra aos jornalistas da empresa.
Times reconhece que solicitar que os leitores paguem US$ 1,50 por dia reduzirá a atual audiência online do jornal, que atinge mais de 20 milhões de leitores mensais. Mas Harding afirma que muitos desses leitores na verdade são visitantes ocasionais que chegam por indicação de serviços de buscas e outros links, e oferecem pouco valor aos anunciantes, que preferem leitores mais dedicados a um jornal ou site.
Para sublinhar sua opinião de que um quadro de leitores menor mas mais participante oferece mais interesse, o Times planeja excluir seus artigos do serviço de busca de notícias Google News, disse uma porta-voz, ainda que os textos devam continuar a ser exibidos nos resultados de busca do Google em si.
Para convencer leitores a pagar, o site do Times planeja oferecer conversas com seus mais conhecidos jornalistas e outras atrações. Aplicativos para celulares estarão incluídos nas assinaturas online.
"É uma decisão audaciosa, como já vimos antes da parte de Murdoch", disse Nick Thomas, analista da Forrester Research, em referência a Rupert Murdoch, presidente do conselho da News Corp. "Mas será que isso garante que vai funcionar? Depende em parte de como os concorrentes responderão".
Um rival a Daily Mail & General Trust, anunciou na semana passada que dificilmente começaria a cobrar pelo acesso ao seu principal jornal, o Daily Mail. Outras empresas jornalísticas britânicas demonstraram maior circunspecção.
Embora o Financial Times tenha demonstrado que é possível convencer leitores a pagar pelo acesso ao site - seu número de assinantes online subiu em 15% no ano passado, para 126 mil, com alta de 43% nas receitas de assinatura -, ele é uma publicação econômica especializada e muitas das assinaturas são pagas por empregadores.
Southern Reporter e outros jornais locais e regionais controlados pela Johnston Press, sediada em Edimburgo, Escócia, encontraram mais dificuldades para cobrar pelo acesso dos leitores. Na semana passada, o acesso gratuito ao site foi restaurado.
A Johnston Press se recusou a comentar sobre uma reportagem do jornal Press Gazette de que o número de assinantes pagantes do Southern Reporter não havia subido a mais que algumas dezenas. A empresa disse que a decisão de cobrar tinha fins de pesquisa.
O maior defensor do acesso online gratuito, entre os jornais britânicos, vem sendo o Guardian. O editor Alan Rusbridger diz que o acesso pago não só prejudica os negócios como contraria o espírito de abertura que define a Internet.
"Caso você adote um sistema de conteúdo fechado e pago, isso significa que está dando as costas ao mundo do conteúdo compartilhado abertamente", ele declarou recentemente.
Tradução: Paulo Migliacci ME
The New York Times
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